Ernesto Neto expande a prática da escultura utilizando-se, na maior parte das vezes, de tecidos com elasticidade, temperos e isopor como principais materiais, e a força da gravidade como elemento determinante. A interação física é outro aspecto fundamental de seu trabalho. O espectador é convidado a participar ativamente, tocando, cheirando ou adentrando o espaço da escultura. As formas orgânicas relacionam-se com a observação do corpo como representação da paisagem interna do organismo, ou numa analogia entre o corpo e a arquitetura.
Só na última década, ele participou de diversos festivais internacionais de arte e apresentou seus trabalhos em galerias e em museus dos cinco continentes. Sua inspiração vem parcialmente de brasileiros do neo-Concretismo do final da década de 1950 e início da década de 1960, como Lygia Clark e Hélio Oiticica, e das idéias rejeitadas do modernismo de abstração geométrica, que pretendiam equiparar a arte com organismos vivos em uma espécie de arquitetura organica, e convidam o espetador a ser um participante ativo.
Ernesto Neto realiza ainda um outro grupo de trabalhos nos quais revela a vontade de capturar o corpo humano no interior das esculturas, como ocorre com Humanóides (2001), nas quais o espectador "veste" a escultura, o que transmite uma sensação de conforto e aconchego. Em trabalhos apresentados entre 2002 e 2003, ele utiliza basicamente luz e tecidos. Cria superfícies de lycra, dentro das quais o espectador pode caminhar, ficando imerso em campos de cor. O tecido deixa de ser o recipiente para os pigmentos e tornar-se, simultaneamente, matéria e cor.
O artista cria em suas obras espaços de intercâmbio, que solicitam do espectador a superação da experiência meramente visual, aguçando seus sentidos. O corpo prevalece como eixo de sua proposta. Emprega constantemente formas que se tocam no espaço, estabelecendo sugestões de sensualidade e de união física, presentes em grande parte de sua produção.
Cada elemento constitutivo exerce função indispensável para manter o conjunto coeso, seja pelo poder de induzir ou sofrer alterações, seja pela faculdade de criar resistência ou canalizar energia de tração. Partindo da alteração da superfície, dá-se o acontecimento: através dos fios tracionados desencadeia-se o fluxo constante de energia vital em todos os sentidos. Tensão, força, resistência, equilíbrio são resultados de cálculos intuitivos que o artista torna possível no embate corporal com o material. A estruturação do trabalho requer movimentos precisos, pois há risco sempre presente de uma catástrofe iminente. Qualquer gesto abrupto ou mal calculado, qualquer modificação não estudada desequilibra as forças vetoriais e o trabalho pode ruir. Desfeita a tensão, o acontecimento não se concretizaria.
A tensão levada ao limite, a fragilidade e a dinâmica das estruturas são comprovadas quando o trabalho é tocado. Há então um entendimento físico-estrutural da obra, onde a forma é conseqüência das necessidades funcionais e os materiais preenchem quesitos de peso, elasticidade e resistência.
Na parede do ambiente doméstico montado por Ernesto Neto na Galeria Artur Fidalgo, em Copacabana, há uma frase escrita à esferográfica: "idéia é isso que cabe dentro".
Os pingos que caem, as formas no chão, são como se o espaço se bastasse a si mesmo, fosse dinâmico sem a interferência dos visitantes que por ele andam, o próprio espaço criando ao se criar.
Ernesto Neto - Nave Deusa, tule de lycra, areia, cravo da índia e isopor, 500 x 950 x 690 cm, 1998. Foto: Eduardo Eckenfels
Obra exposta no Museu de Inhotim http://www.inhotim.org.br/arte/obra/view/182
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